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15 setembro, 2012

Nas ruas, os ipês com suas estonteantes cores anunciavam a chegada de mais uma primavera. O céu azul como o do nordeste proclamava que seria calor. Clara, em sua casa, se aprontava para mais uma jornada de oito horas de trabalho. Ela era jornalista, ou melhor: fotógrafa jornalística - se é que se pode definir assim - Para ela, seria uma dia típico e rotineiro: Sairia para cobrir alguns eventos da cidade; iria em campanhas políticas, e depois, provavelmente veria uma grande tragédia e correria com sua câmera para registrar mais uma efemeridade da vida. Era tanta catástrofe ao seu redor, que aquilo para ela, era normal. Não se assustava com devastosos acidentes de carros, com corpos sangrentos pelas vielas das favelas, com bala perdida e com choro de mãe ao ver o filho morrendo. Tudo aquilo, embora fosse frívolo, para ela, era habitual. Ela aprendeu a ver a vida, e portanto, a morte de uma maneira única, se tornarou uma pessoa fria e, para alguns, era considerada pessimista demais. Mas a grande verdade é que a todo momento de sua vida ela tentava escapar de uma idéia de realidade e sozinha, em casa, ela praticava seu francês escrevendo pequenas coisas: relatava em seu diario suas experiências cotidianas. Em um desses se podia ler em uma péssima grafia: "On aime la vie, mais le néant ne laisse pas d'avoir du bon". Clara estava aparentemente em crise, seja ela qual for, se sabia que era necessário uma terapia, um psicólogo ou uma dose extra de Fluoxetina. Ela dizia que gostava mais quando conseguia imaginar que as pessoas eram boas, mesmo que não fossem. E assim, a primavera se fazia inverno.

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